
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta quarta-feira, para responsabilizar as redes sociais por conteúdos publicados por seus usuários. Seis ministros defenderam ampliar as obrigações das big techs a respeito da moderação de posts considerados ofensivos, mesmo na ausência de ordem judicial prévia. Ainda devem ser definidas, nas próximas sessões, as condições em que plataformas devem responder judicialmente.
Votaram para responsabilizar os provedores de internet: os ministros Dias Toffoli, Luiz Fux, Flávio Dino, Cristiano Zanin, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. O entendimento deles impõe responsabilidades mais severas às plataformas quanto aos conteúdos publicados, além de estabelecer para as empresas uma série de regras que precisam ser cumpridas, sob pena de violação das leis brasileiras. O julgamento será retomado hoje.
O debate gira em torno da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que exige uma ordem judicial prévia para excluir conteúdo e responsabilizar provedores, websites e gestores de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros.
Inconstitucional
A ação tem relatoria dos ministros Dias Toffoli e Luiz Fux. Eles consideram inconstitucional a exigência de notificação judicial para retirada de conteúdo ofensivo.
O presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, entendeu que a norma é parcialmente inconstitucional. Para o magistrado, a obrigação deve ser mantida em algumas situações específicas, como nos crimes contra a honra, porque, nesses casos, a retirada da exigência poderia comprometer a proteção à liberdade de expressão.
Flávio Dino defendeu que não existe liberdade sem responsabilidade, conforme a Constituição. "Liberdade sem responsabilidade é tirania. Ideia de que regulação mata a liberdade é absolutamente falsa. Responsabilidade evita a barbárie. Entendo que devemos, como tribunal, avançar na direção da liberdade com responsabilidade. Liberdade regulada é a única liberdade", sustentou.
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Por sua vez, Cristiano Zanin votou para diferenciar "conteúdos evidentemente criminosos ou ilícitos" de publicações em que houver "dúvida razoável sobre a ilicitude do conteúdo". No primeiro caso, as plataformas podem ser punidas se deixarem de remover postagens após notificação dos usuários. No segundo, os provedores podem aguardar uma ordem judicial.
O decano Gilmar Mendes propôs que o artigo 19 seja aplicado apenas em situações específicas, como crimes contra a honra e conteúdos jornalísticos. Para o ministro, a análise nesses casos deve ficar a cargo do Judiciário. O magistrado também defendeu que as plataformas devem desenvolver mecanismos técnicos para estender decisões de remoção de conteúdo, sejam elas por ordem judicial, sejam por notificação privada.
Divergência
Já André Mendonça foi o único que, até agora, divergiu. Para o magistrado, as plataformas só poderão responder a ações judiciais se descumprirem deveres procedimentais previstos em lei.
"Não se pretende defender a irresponsabilidade das plataformas. O que se busca é, em defesa da liberdade de expressão, condicionar essa responsabilização por discurso de terceiro apenas aos casos em que verificado o descumprimento de um dever procedimental, apto a demonstrar que não atuou com a devida diligência", ressaltou.
O ministro também disse que o debate não deve ficar a cargo do Judiciário. "Penso que, ao assumir maior protagonismo em questões que deveriam ser objeto de deliberação pelo Congresso Nacional, o Poder Judiciário acaba contribuindo, ainda que não intencionalmente, para a agudização da sensação de desconfiança hoje verificada em parcela significativa da sociedade. É preciso quebrar esse ciclo vicioso", defendeu.
O que disseram os ministros
Luiz Fux — “Considera-se evidentemente ilícito o conteúdo gerado por terceiro que veicule discurso de ódio, racismo, pedofilia, incitação à violência, apologia à abolição violenta do Estado Democrático de Direito e apologia de golpe de Estado.”
Dias Toffoli — “Os provedores de aplicações de internet devem atuar de forma responsável, transparente e cautelosa, a fim de assegurar um ambiente digital seguro, previsível e confiável.”
Luís Roberto Barroso — “Existem muitas situações em que a exigência de ordem judicial acarreta a proteção insuficiente de direitos que precisamos proteger, como o direito à vida, à integridade física, à saúde pública e à estabilidade democrática.”
Flávio Dino — "As redes sociais não aproximaram a humanidade daquilo que ela tem de melhor.”
Cristiano Zanin — "Essa liberdade de expressão pode estar sendo mal utilizada para atacar o Estado de Direito, a incolumidade física das pessoas, inclusive crianças e adolescentes."
Gilmar Mendes — “Regular plataformas digitais é proteger direitos, inclusive, a liberdade de expressão, não a restringir."
André Mendonça — “Não é possível responsabilizar plataformas sem prévia determinação judicial quando se está diante de manifestação de opinião ou de pensamento.”
O PLACAR
Até esta quarta-feira, havia seis votos para ampliar, de diferentes modos, a responsabilização das redes sociais; e um divergente
>> Manter exigência de ordem judicial para remover qualquer conteúdo – 1 voto (André Mendonça)
>> Manter exigência de ordem judicial só para crimes contra a honra – 4 votos (Luís Roberto Barroso, Flávio Dino, Cristiano Zanin e Gilmar Mendes)
>> Derrubar totalmente a exigência de ordem judicial – 2 votos (Dias Toffoli e Luiz Fux)
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